“A cachaça não tinha o poder de acabar com o frio, mas era como se ao tomá-la o corpo de Jura conquistasse o poder de se tornar indiferente ao clima.”
De todos os vícios, o álcool é provavelmente aquele que conta com a maior tolerância na Cultura Ocidental. Quando o império do tabaco começou a ruir na virada do século passado, devido a conscientização dos problemas de saúde causados pelo cigarro, a indústria das bebidas alcóolicas tomou alguns cuidados para não ter o nome de seus produtos associado aos danos que causam na saúde e na vida de seus usuários. Prova disso é que, ainda hoje, quando notícias são veiculadas sobre os impactos do uso de drogas é costume vir da seguinte forma: o uso de drogas e álcool, ocasiona isso, ou aquilo. Como se o álcool não fosse uma droga, o que a colocaria como uma substância cuja ingestão não trouxesse problemas.
O que, além do poder da indústria da bebida, explicaria essa benevolência com a droga mais popular e uma das mais letais que existe? A exemplo das campanhas contra o tabaco, seria possível imaginar hoje toda uma publicidade revelando o quanto o consumo de álcool é perigoso? Ideias não faltam: representações de brigas de trânsito, acidentes, testemunhos de dependentes, etc. Só a inegável influência da indústria do álcool impede que esse véu seja retirado e os jovens passem a ter plena consciências dos riscos aos quais estão se expondo ao ingerir bebidas alcóolicas.
As pesquisas que mostram o quanto o álcool é prejudicial a saúde são vastas na comunidade acadêmica internacional (1). Algumas delas até chegam ao ponto de afirmar que não há uma quantidade segura de ingestão de álcool (2) e que ele é ainda mais agressivo em adolescentes, gestantes e idosos. Por ser tolerado pela sociedade, o consumo de bebidas alcóolicas só é visto como um problema quando o usuário não consegue mais cumprir com o seu papel na comunidade o que acarreta problemas no emprego, na família e no convívio social. Quando a convivência se torna impossível, a reação da sociedade geralmente é de repulsa e o tratamento em relação ao alcoólatra é o mesmo que se dá a outros dependentes químicos: o abandono.
Ao contrário do que fomos ensinados, o alcoolismo não é um problema de caráter, e sim de saúde. Ninguém está imune aos seus efeitos degradantes e a solução começa pela implementação de políticas públicas de prevenção e de tratamento. Costuma-se afirmar que a vida é feita de escolhas, mas só pode ser chamado de “escolha” quando temos opções e a noção de seus impactos. Não há escolhas num jogo de “roleta russa”. Quando milhões de jovens tem como única forma de inserção social um boteco ou uma boca de fumo, não se pode afirmar que essa ou aquela pessoa “escolheu” as drogas! Como “escolheu” se não lhe foi oferecida outra possibilidade? Que a cada dia trabalhemos por uma sociedade com mais oportunidades para todos e que acolha aos que até hoje, foram por nós abandonados.
Fontes consultadas:
1: As Consequências do Consumo Excessivo de Álcool (opas.org.br) - Pesquisado em 19/11/2022 as 11:00hs
2: Neurologista alerta para os riscos da ingestão de álcool - Portal Correio – Pesquisado em 19/11/2020 – 11:00hs
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