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Foto do escritorAparecido Galindo

O HOMÚNCULO


Gerado em uma retorta

aquecida com estrume

eis que chegou à vida

a figura do Homúnculo.


Estranho ser que conquistou

as rédeas da Natureza

e a conduziu sem escrúpulos

ao fundo de um lamaçal.


Ah! Se tivesse sido gerado

em um útero materno!

E recebido por alimento

um pouco de humanidade.


Assim lamentavam as mães

que um dia amamentaram

àqueles a quem o ego

do Homúnculo devorou.


Ao seu império de medo

somou-se o de mentiras

e o que não era real

coube a ele inventar.


Dizia que os sentimentos

não fazem subir a bolsa

e que de boa vontade

não se faz o capital.


Ele afirmava que o mérito

é uma régua sagrada

que divide os humanos

em duas grandes castas.


A primeira: dos vencedores

em cujas mãos devem estar

as chaves para o futuro

do homem superior.


A segunda: dos derrotados

a quem só cabe louvar

aos seus benfeitores

seres extraordinários.


Ah! Se o vento tocasse

a face do Homúnculo!

Ah! Se a chuva regasse

o amor em sua fronte


Assim diziam os poetas

antes das execuções

que pouparam unicamente

a súcia de bajuladores.


O Homúnculo não saía

jamais de sua redoma

e temia que um pássaro

quebrasse o seu encanto.


Por isso cortou as árvores

e incendiou os campos

e o que podia ser rentável

levou para um zoológico.


E todos os continentes

jaziam em suas mãos

que alimentaram os oceanos

com esgoto, sangue e plástico.


Ele pensou que a beleza

do céu lhe desafiava

e desejou capturar

a luz de uma estrela.


E seus foguetes romperam

do ar as quatro camadas

deixando pelo caminho

pedaços de solidão.


Eis que a terra é azul!

Declarou seu operário.

Mas o Homúnculo insistia

ter ela a cor de sangue.


O mesmo sangue das nações

que uma a uma tombaram

a combaterem sem êxito

o seu rival mais cruel.


E se o Homúnculo sangrasse

como todos os mortais?

Perguntavam-se os sábios

no fundo das masmorras.


Não sabiam os detratores

que por mais que desejasse

Homúnculo não poderia

sangue e lágrima verter.


As rochas se erodem

sem demonstrarem fraquezas

até que um certo dia

se mostram em grãos de areia.


Assim também o Homúnculo

ao despedir-se do mundo

não deixou registrado

o dia de sua partida.


Pois tinha se multiplicado

com tamanha perfeição

que ninguém poderia afirmar

se foi passado ou presente.


Seu túmulo porém ficou

desconhecido por todos

resta a dúvida se ele esteve

entre nós ou ainda está.


Obs: obra pertencente ao livro ainda inédito "De quando nasce uma flor".


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